quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Recordar Mark Twain…

… Que disse, no final da sua vida, e a propósito de um seu obituário prematuramente publicado, que «as notícias da minha morte são grandemente exageradas», é o que me ocorre fazer quando leio as «previsões», ou até mesmo as «determinações» sumárias da «morte política» - ou, pelo menos, «morte política» na presente campanha presidencial norte-americana – de alguns candidatos, nomeadamente Herman Cain e Rick Perry.
É, na verdade, muito arriscado, atrevido, e até ridículo, estar a afirmar peremptoriamente, «preto no branco», que determinada pessoa está em «queda» (irreversível) ou que chegou ao «fim» («the end»!), porque cometeu (disse) um ou outro erro ou porque surgiram algumas alegações prejudiciais, e até acusações, quanto ao seu passado pessoal e/ou profissional. Regresse-se à realidade: a «queda» e o «fim» em política, e mais concretamente numa eleição específica, só acontecem a um candidato em três circunstâncias. Primeira, quando ele morre (mesmo!). Segunda, quando ele desiste (como fez Tim Pawlenty). Terceira, quando perde nos votos – uma, duas, três, várias vezes, todas as vezes, e/ou a última e decisiva vez. Não acontecem porque «especialistas (não muito) encartados» o dizem.
Herman Cain e Rick Perry não estão afastados da «corrida», e não só porque (ainda) não preenchem os três «requisitos» acima referidos. É também porque, em última análise, concorrem, não tanto um contra o outro e ambos contra os restantes candidatos pelo Partido Republicano, mas sim, principalmente, contra Barack Obama – contra o que este disse e, principalmente, contra o que fez (ou não). Compare-se: é assim tão grave que Perry tenha estado 53 segundos a tentar lembrar-se (e não conseguiu…) de qual era o terceiro departamento federal que extinguiria se fosse presidente… comparado com Obama a dizer que já tinha visitado «57 Estados»? É assim tão grave que Cain demonstre ter algumas deficiências na área das relações internacionais… comparado com Obama a dar a entender que pensa(va) que existe(ia) uma «língua austríaca»? Portanto, que tal um pouco de perspectiva, se fazem favor?
A «branca» de Rick Perry não tardou em ser (bem) aproveitada, com humor, pelo próprio e pela sua candidatura, que de imediato desafiaram os norte-americanos a indicarem qual o sector da burocracia governamental que gostariam de «esquecer»; a falha do governador do Texas poderá até ter servido para humanizá-lo e aproximá-lo ainda mais dos eleitores.
Quanto a Herman Cain… quase é preciso escolher por onde começar a desmontar a campanha de destruição que contra ele tem vindo a ser construída. Comportamentos impróprios? Compare-se com outro presidente democrata, Bill Clinton. Este, indubitavelmente, foi adúltero com várias mulheres, antes e depois de entrar na Casa Branca - com, por exemplo, e respectivamente, Gennifer Flowers e Monica Lewinski; e várias outras mulheres queixaram-se de terem recebido «propostas indecentes» de Bubba, como Paula Jones… e Kathleen Willey, que, agora, é apoiante de Cain! E no que se refere à frente externa… pois, está bem: alguma incerteza quanto à Líbia e incapacidade em dizer o nome do presidente do Uzbequistão. E daí? George W. Bush, quando se candidatou pela primeira vez, foi ridicularizado por não saber o nome do então presidente do Paquistão (Pervez Musharraf)… mas isso não o impediu de vencer e de estabelecer com o seu homólogo paquistanês uma ligação privilegiada na guerra contra o terrorismo. Agora, o que é mesmo incorrecto, e até indigno, é Hillary Clinton troçar da ignorância de um seu compatriota, mesmo que adversário político, em companhia de… Hamid Karzai, o «aliado» presidente do Afeganistão que se tem «distinguido», entre outras acções «beneméritas», por não atenuar – e até atiçar – os conflitos entre muçulmanos e cristãos, e afirmar que se colocaria ao lado do… Paquistão num eventual conflito entre aquele e os EUA! E aqui Cain estaria à vontade: ele pode (ainda) não ter certezas quanto a assuntos diplomáticos mas tem-nas sobre assuntos militares, já que foi especialista em balística na Marinha norte-americana e sabe muito bem que sistemas de mísseis (e outros) o país tem e pode utilizar em caso de conflito.
Numa campanha, numa «corrida» eleitoral, se é longa («maratona» e não «100 metros»), há sempre oportunidades para saltar para a frente… e cair para a retaguarda; e vice-versa. Nos EUA isso é ainda mais verdade. Veja-se Newt Gingrich: está a ressurgir nas sondagens e a aproximar-se do topo das preferências, mas quem iria prever isto quando, há poucos meses, estava perto do último lugar depois de ter criticado Paul Ryan e de vários dos seus colaboradores o terem deixado? E há que não esquecer outros factos que ainda o poderão prejudicar, entre os quais a sua ligação (muito bem remunerada) à Freddie Mac, a sua conta na Tiffany's, a sua (ocasional?) adesão à teoria - isto é, fraude - do «aquecimento global» e, claro, os seus divórcios... que, segundo Ann Coulter, o tornam «oficiosamente» inelegível. Nunca algum homem (previamente) divorciado se tornou presidente... com uma excepção: Ronald Reagan - mas este foi o abandonado (pela actriz Jane Wyman, sua primeira esposa) e não o que abandonou (como, por exemplo, John McCain...)
Assim, e por tudo isto, concluamos recorrendo novamente às irónicas palavras do autor das aventuras de Tom Sawyer e de Huckleberry Finn: «arranjem primeiro os vossos factos, e depois podem distorcê-los como quiserem.»  

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