domingo, 6 de setembro de 2015

Ontem o autocarro, hoje o cartório

Talvez no futuro eu venha a olhar este caso de maneira diferente… mas a verdade é que, presentemente, Kim Davis faz-me lembrar Rosa Parks. E não sou o único. Ambas foram – e, no caso da funcionária pública do Kentucky, ela ainda está a ser – vítima(s) de democratas segregacionistas, segregação essa que deixou de ser feita apenas em função da cor da pele, da etnia, da raça, para incluir também a (des)orientação sexual. Ambas foram presas por se recusarem a fazer algo que considera(va)m errado e que, de facto, não tinha e não tem legitimidade. Ontem o autocarro, hoje o cartório.
Um texto de João Mendes sobre este assunto publicado no blog Aventar intitulado «Fundamentalismo cristão» veio mais uma vez demonstrar, como se tal fosse necessário, a elevada ignorância – quando não intolerância – sobre o que acontece nos EUA, e que é causa frequente de disparates ditos e escritos. Pelo que, em comentário, lhe respondi: «A união (casamento) entre homossexuais é legal naquele Estado norte-americano (Kentucky)»? Só o é aparentemente, tal como em quase todos os outros 49, por via de uma decisão ilegítima de cinco (em nove) juízes do Supremo Tribunal dos EUA, dois dos quais deveriam ter sido impedidos, por flagrante falta de isenção, de participar na decisão porque... anteriormente tinham oficiado «casamentos» entre pessoas do mesmo sexo! Basearam abusivamente a sua decisão – ilegítima, repete-se – na 14ª emenda da Constituição dos EUA, redigida e aprovada especificamente para garantir aos negros, depois da guerra civil, os mesmos direitos dos brancos. Cinco juízes, cinco pessoas, que se atreveram a considerar inválidas as decisões tomadas legítima e legalmente por muitos milhões de cidadãos em cerca de 30 Estados, quer directamente (por referendo) quer indirectamente (através dos seus representantes eleitos nos parlamentos estaduais) no sentido de só reconhecer como válido o matrimónio entre um homem e uma mulher. No Kentucky isso aconteceu em 2004, numa votação em que 75% dos eleitores se opuseram à redefinição do casamento...
... Pelo que Kim Davis - que, curiosamente, é democrata (e eleita para o cargo que ocupa)! - baseia a sua atitude não só na sua fé religiosa mas também na própria decisão soberana dos seus concidadãos. Os homossexuais que querem «casar-se» com outros podem fazê-lo noutros cartórios, noutros condados e até noutros Estados, mas aqueles, deliberadamente, identificam e tomam como alvo as pessoas e as instituições que - justificadamente - se recusam a ceder perante o activismo e a tirania judiciais, tentando prejudicá-las pela desfavorável exposição mediática, por processos em tribunal, pelo despedimento, pela falência. Tudo isto tem acontecido nos EUA, mas ninguém tinha sido preso por se recusar a participar em algo com o qual não concorda e, mais do que isso, que não tem qualquer validade nem jurídica nem política... até agora: Kim Davis foi colocada numa cela esta semana, o que só vem confirmar a tendência totalitária da «revolução arco-íris». Deixei, por último, um esclarecimento sobre bombistas reais e potenciais: infelizmente, é relativamente fácil ter acesso a explosivos e às técnicas da sua utilização. Porém, não há notícias (que eu saiba) de cristãos a atacarem homossexuais, isoladamente ou em grupo, em «parada». Compare-se com os (muçulmanos fundamentalistas) irmãos Tsarnaev, que em 2013 atacaram a maratona de Boston... e nem foi com C-4; e com Bryce Williams, ex-jornalista, homossexual e negro, apoiante de Barack Obama (chegou ao cúmulo de usar um pin do Sr. Hussein em estúdio, perante as câmaras) que na semana passada assassinou a tiro dois ex-colegas - heterossexuais e brancos - da estação de televisão da Virgínia onde trabalhou, enquanto estes faziam uma reportagem em directo e filmando ele próprio o crime! Williams queixava-se de discriminação. Afinal, quem é mesmo «troglodita»? 
Do outro lado do Atlântico as reacções ao «caso Kim Davis» foram o que era de esperar. Da parte dos democratas a mais irritante hipocrisia: tanto Josh Earnest como Hillary Clinton afirmaram que ninguém deve estar «acima da lei» - quando, desde Janeiro de 2009, os «burros» mais não têm feito do que isso mesmo, desde as acções executivas de Barack Obama na imigração e na saúde ao servidor de correio electrónico privado da ex-secretária de Estado, passando pela perseguição do IRS a organizações conservadoras e pela criação de «cidades-santuário» para criminosos foragidos e procurados… além de que claro, não existe realmente qualquer lei federal, nacional, que permita o «casamento gay». Da parte dos republicanos a divisão entre a firmeza das convicções e a fraqueza das conjunturas: Ted Cruz, Mick Huckabee, Rand Paul e Rick Santorum sabem bem o que significa ser membro do GOP e o que o partido de Abraham Lincoln representa desde a sua fundação, mas Lindsey Graham, John Kasich e Donald Trump, aparentemente, não sabem.
David Bunning, o juíz – nomeado por George W. Bush! – que ordenou a prisão de Kim Davis – sem fiança, algo que muitos assassinos tiveram – tornou-se, com esta decisão, a mais recente «adição» numa «lista» de magistrados que, começando com Vaughn Walker na Califórnia, passando por todos aqueles que «anularam» os votos populares nos respectivos Estados e acabando nos cinco do ST, deveriam ser não só destituídos dos seus cargos mas também presos pelas afrontas que têm cometido e que subverte(ra)m o sistema judicial norte-americano. Outra consequência, e talvez a mais grave, da presidência de Barack Obama.   

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